Opinião

Um estranho modo de encarar o futuro

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Publiquei aqui em 13/03/2021, em tradução, uma reportagem do Le Monde sobre a crise provocada pela pandemia no santuário de Lourdes (França), cuja economia depende em mais de 80% da indústria turística. Mais precisamente do turismo religioso, ou de peregrinação.

Foi agora a vez do Expresso publicar também uma reportagem sobre o Algarve, cuja economia depende em mais de 80% do turismo. Neste caso do turismo balnear, de praia.

Cabe assinalar que, embora o Algarve represente em termos financeiros bastante mais em Portugal do que Lourdes em França, de acordo com o Le Monde, o santuário gaulês conseguia todos os anos, antes da pandemia, só na hotelaria e restauração, um volume de negócios da ordem dos 360 milhões de euros. E o Algarve? Pois, boa pergunta, à qual todavia a reportagem do Expresso não responde.

A falta de dados sobre o volume de negócios, não é contudo a única diferença entre as duas reportagens. Há outra bem mais grave e até inquietante para quem escreve estas linhas. Na reportagem francesa mencionam-se lateralmente as ajudas do governo e da região, bem como os donativos estrangeiros, mas há sobretudo, nas palavras dos profissionais entrevistados, ansiedade e desejo de mudança rumo ao futuro, com referências à necessidade de renovação, de procurar novos modelos, da parte de todos eles. Incluindo o responsável pelo santuário de Lourdes, com os seus 250 empregados.

Inversamente, na reportagem do Expresso, que pode ler aqui praticamente só se fala de ajudas governamentais. Nenhum dos profissionais de turismo entrevistados teve sequer uma palavra sobre inovação, renovação, reinvenção, modelo económico ultrapassado…

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O que isto mostra, no meu entender, é que  na pequena cidade de Lourdes, a 800 quilómetros de Paris e com metade da população de Tomar, já se percebeu que, na área do turismo, como nas outras, pouco ou nada vai ser como antes depois da pandemia. O que vai obrigar a inovar. Inversamente, no nosso comparativamente vasto Algarve, nada de concreto, para além da habitual pedincha.

Os empresários parecem estar todos concentrados na vinda de ajudas e subsídios a fundo perdido. Não deve por isso surpreender ninguém que, como país, estejamos cada vez mais na cauda da Europa. Entre o valor acrescentado da produção de bens transacionáveis, e as esmolas do Estado ou do poder local, saídas sobretudo dos bolsos de quem trabalha e produz valor acrescentado, a escolha é clara. Somos sobretudo um país de pedintes. Tanto a nível nacional como local.

Voltando a Tomar, pode ser muito agradável e auspicioso para quem governa ir aumentando os subsídios e outras despesas permanentes, enquanto as receitas municipais vão diminuindo. Mas é uma situação que naturalmente não pode durar muito tempo, por falta de recursos. Razão poderosa para elaborar quanto antes alguns planos locais de desenvolvimento, a começar pelo do turismo.

Porque no triste estado actual das coisas, a esmagadora maioria dos visitantes vai ao Convento e pisga-se. A terra é pouco acolhedora, nomeadamente em termos de estruturas de acolhimento.

                                                          António Rebelo

 

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3 comentários

  1. Feliz o titulo, infeliz o (nosso) Futuro.
    Pois que em Tomar. quem deveria cuidar do Futuro, de o preparar desde já, não o faz.
    E quem tem o dever de o fazer, a Camara municipal, comandada pelos autarcas eleitos, não o faz.
    Se por incapacidade, se por impreparação, ou se por incompetência, não sabemos.
    Certo é que, desde há várias décadas, acontece declínio em Tomar, e os autarcas nada fizeram, nem fazem, para lá de exibir, contentamento com visitas e comemorações, sorrisos com protocolos que celebram, almoços com associações que integram, e vaidade ou contentamento com cargos que ocupam.
    Do Futuro, um discurso aqui e acolá, uma ideia tímida ali, um sonho de realização acolá.
    Uma visão dos problemas e dos desafios para os vencer, não existe.
    Que setores atrair para investimento? Que vantagens explorar?
    Onde serão os empregos a criar, e a formação a fazer?
    Quantos idosos terá o Concelho daqui a 20 anos, e quais as estruturas para os acolher?
    Que papel terá o nosso monumento Património da humanidade a desempenhar? Poderá ser ancora de quê?
    Seremos uma cidade de Turismo? Ou de Serviços? Quais?
    Seremos uma cidade de Industria? Qual?
    Seremos uma cidade Jardim? Ou Templária?
    Seremos o quê, para lá do cenário de decadência para onde estamos a deslizar?

  2. Nota 1. Sendo a França um dos países que mais aposta e bem no turismo, este representa 1% do PIB. Quem o disse foi o atual ministro Nuno Santos há uns 6 anos. Nota 2. Se é uma evidência o declínio de Tomar de há várias décadas (e das instituições que ainda cá restam, digo eu) as responsabilidades, se das sucessivas câmaras, só podem residir nos eleitores locais. Nota 3. A situação atual pode ser de não retorno porque não há alternativa credível nem condições para a construir: os mais exigentes foram embora, ainda que alguns venham para se mostrar ou preparar carreira no litoral; outros esperam pela reforma ou basta-lhes um prato de lentilhas, uma sopa ou um passeio para não importunar.

    1. Resposta à Nota 1:
      Entretanto em França, os dados sobre turismo são outros e bem diferentes. Segundo CEDEF – Centre de documentation Economie e Finances, um organismo governamental, em 2018 a França foi o pais que mais visitantes recebeu no Mundo, com um total de 89 milhões de turistas estrangeiros, ocupando o 3º lugar, após a Espanha e os Estados Unidos, quanto a despesas, com 55,5 mil milhões de euros. Nesse mesmo ano de 2018, o consumo turístico representou 7,4% do PIB. Bem melhor que o tal i%.
      Resposta à nota 2:
      Quando apontados como responsáveis pelo acentuado declínio tomarense, os eleitores mais capazes de argumentar alegam que votaram assim porque não havia escolha. E pelo andar da carruagem, este ano vai haver ainda menos escolha, se excluirmos o Chega.
      Resposta à nota 3:
      Embora concorde com a sua argumentação, não me parece que a situação tomarense actual seja já de não retorno. Em política há sempre alternativas. À falta de outra saída, acossados pela crítica e assustados com o que constatam, acredito que sejam os próprios instalados no poder a decidir singrar outros mares. Começando, por exemplo, por arranjar um plano local credível de desenvolvimento turístico e económico. Oxalá!

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