Uma mulher de 54 anos, de Santarém, com uma doença psiquiátrica, foi autorizada pelo Tribunal da Relação de Évora a casar ou constituir união de facto.
Na primeira sentença, do tribunal de Santarém, o juiz decidiu que a mulher, ex-bancária, tinha de ser acompanhada por um familiar e não podia “exercer livremente os direitos de testar, casar, constituir situações de união, fixar domicílio e residência e deslocar-se para o estrangeiro, carecendo de autorização do acompanhante para o efeito”, entre outras restrições como por exemplo movimentar contas bancárias.
Foi em 1995 que a mulher começou a ser acompanhada nas consultas de Psiquiatria do Hospital Distrital de Santarém, com diagnóstico inicial de depressão. Três anos depois começou a ter ideias delirantes de perseguição. Em 2009 foi-lhe diagnosticada Perturbação Depressiva Recorrente com Sintomas Psicóticos, sendo reformada por invalidez.
A sua situação clínica agravou-se em 2016 com a morte do pai. Teve de ser internada várias vezes. Enquanto isso foi contraindo alguns empréstimos bancários.
O último diagnóstico é o de “Perturbação Afectiva Bipolar, caracterizada por episódios de mania e sintomas psicóticos”, uma patologia que “tem evoluído por surtos, sem retorno ao estado pré-mórbido”.
Na argumentação do recurso judicial, a advogada invoca que “o diagnóstico de transtorno bipolar não lhe retira capacidade para decidir a sua própria vida e gerir a mesma sem recurso a um terceiro”. Garante que a mulher está estabilizada, toma a medicação, não é agressiva, não tem gastos desnecessários, e que sabe gerir o seu dinheiro, sendo seu desejo voltar à sua vida independente e viver sozinha sem pressões dos seus familiares.
Quanto às medidas de acompanhamento decretadas pelo tribunal de Tomar, a mulher não aceita “a limitação de direitos pessoais de testar, casar e constituir união, fixar domicílio e residência e deslocação para o estrangeiro, afirmando ter total discernimento e total capacidade intelectual ou volitiva”.
Uma psiquiatra atestou que a mulher tem capacidade para casar e constituir união de facto, mas isso não deve acontecer “durante um episódio de mania e na presença de sintomas psicóticos”. Aponta, no entanto, para maiores dificuldades de decisão quanto à gestão do património e na orientação complexa associada às deslocações em longas distâncias, mas essas dificuldades não foram identificadas no desenvolvimento de relações pessoais íntimas.
O Tribunal da Relação de Évora considerou que “estamos perante direitos essenciais do desenvolvimento da personalidade da beneficiária, associados ao seu foro íntimo e à sua afectividade”, pelo que “a sua restrição apenas se justificaria se a perturbação mental fosse suficientemente grave para a impedir de tomar uma decisão consciente e esclarecida sobre estes temas”.
Em conclusão, o tribunal considera que “os direitos pessoais de casar e unir de facto são, em princípio, livres”. No entanto, quanto às outras restrições manteve a decisão inicial.
O acórdão do Tribunal da Relação de Évora pode ser lido aqui