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Fiquei atónito: “PSD Tomar – Lista de José Delgado promete não dizer mal de ninguém”, noticiou há dias este blogue. Sabendo-se que uma lista não pode por definição emitir opinião, ou assumir qualquer posição, por ser uma entidade inerte enquanto tal, deve ler-se “todos os componentes da lista de José Delgado prometem não dizer mal de ninguém”.
É estranho, por subentender que pelo menos os componentes da outra lista…Mas aceite-se, pois estamos felizmente em democracia. Aparece porém logo a seguir a natureza multivalente da expressão “não dizer mal”. Quer se queira ou não, em português corrente, dizer mal pode significar coisas bem diferentes e insinuar dezenas de outras. Vejamos:
A – O significado mais corrente da expressão é criticar negativamente, difamar, caluniar, ofender, vilipendiar;
B – Dizer mal também pode ser, quanto à forma, algo de irremediável no imediato. Diz mal, oralmente ou por escrito, quem não consegue falar ou escrever melhor. É portanto involuntário.
C – Da junção de A e B podem resultar situações pouco claras, equívocas até: “Dizer mal” com toda a correcção, ainda será dizer mal? Inversamente, “Dizer bem”, cometendo erros vocabulares, ou de construção frásica, ainda será dizer bem?
Pois é. Há a forma e há o conteúdo semântico. Que nem todos enxergam.
Para lá da evidente ambiguidade, demonstrada em A B e C, parece consensual que, em termos políticos, dizer mal é sinónimo de discordar, criticar negativamente, deitar abaixo. Sucede que, quando se começa a amalgamar discordâncias com má-língua, o autoritarismo já está à espreita e a ditadura de facto não vem longe. De braço dado com a pobreza de espírito, a pior de todas.
No caso em apreço, a tomada de posição dos integrantes da lista de José Delgado só me surpreendeu pela evidente ousadia. Confundir crítica, discordância, alternativa, ponto de vista diferente, com “dizer mal”, é sinal de evidente carência de bagagem cívica, ética e até ideológica. Contudo, bem vistas as coisas, há quase quatro anos que a equipa laranja integra o executivo municipal, mas praticamente ainda ninguém deu por isso. É corrente ouvir dizer pela cidade que “não há oposição”.
Percebe-se agora com toda a clareza porquê: José Delgado e os seus fizeram a promessa de “não dizer mal”. Não podem por isso criticar a maioria socialista em funções. Há por vezes uma excepção – a vereadora Bonet, que se não erro nem sequer integra a nova lista concorrente.
Sinal dos tempos?
É o silêncio profundo
Do pessoal atarantado
Anda tudo desanimado
E Tomar bate no fundo
E Tomar bate no fundo
Vítima de oportunistas
Eleitos e outros golpistas
Incapazes e autistas
Que não entendem o Mundo
Que não entendem o Mundo
Nem querem saber dos outros
São estes e aqueloutros
Todos de bolso sem fundo
Todos de bolso sem fundo
Muito cheios de prosápia
Têm sempre muita lábia
Juram ter perspicácia
Mas nem entendem o Mundo
Óh Camões chega-te pra lá
Q’outros valores s’alevantam
O Relvas vai debitar
E no PSD de Tomar
C’ Ferromau a comandar,
Ai Jasus que lhes deu prá poesia.