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Sobre o problema do grupo de judeus de Tomar impedidos de rezar na sinagoga com o argumento de que era proibido fazer ali cerimónias, a câmara emitiu um esclarecimento onde acaba por reconhecer o erro, mas não pede desculpa.
Por email, “Tomar na Rede” pediu esclarecimentos à câmara sobre aquela proibição, mas como sempre a autarquia não respondeu diretamente preferindo publicar o esclarecimento no Facebook.
Mesmo assim, o líder da Comunidade Judaica de Tomar, Pedro Turner, não aceita alguns argumentos da câmara e continua à espera de resposta a um pedido de reunião urgente sobre o problema.
Publicamos a seguir o esclarecimento da câmara e a resposta de Pedro Turner:
Esclarecimento do Município de Tomar sobre o acesso à Sinagoga
Em relação a uma notícia posta a circular sobre um alegado impedimento de rezar na Sinagoga a um grupo de judeus, o Município de Tomar vem esclarecer o seguinte:
– O edifício da Sinagoga de Tomar foi adquirido por Samuel Schwarz em 1923 e doado ao Estado Português, em 1939, com a condição de nele ser instalado um museu luso-hebraico, o que aconteceria após obras de adaptação em 1942 e 1943. Mais recentemente, o espaço foi alvo de uma profunda recuperação, que incluiu a criação de um núcleo interpretativo, aberto em 2019.
– Atualmente sob a tutela do Município de Tomar, a Sinagoga é, pois, um espaço museológico, o mais visitado da cidade a seguir ao Convento de Cristo. A sua abertura ao público é feita de terça-feira a domingo, através de vigilantes da empresa com quem foi contratualizado o serviço, presentemente a Caminhos da História, com sede nesta cidade.
– Não sendo na atualidade um espaço de culto, nunca foi negado a ninguém a possibilidade de ali rezar, dentro do horário de abertura e sempre com a salvaguarda de que poderia ocorrer a visita de turistas em simultâneo.
– Porém, sempre que solicitado previamente ao Município, a Sinagoga tem sido utilizada para cerimónias religiosas fora desses dias e horários, garantindo os serviços da autarquia ou, a pedido destes, a empresa contratualizada, a presença de funcionários para o efeito.
– No cumprimento da Constituição da República Portuguesa, o Município de Tomar promove a separação entre aquilo que é da esfera da política e da religião, mas defende, de igual modo, o direito de todos os cidadãos a expressarem os seus sentimentos religiosos, quaisquer que eles sejam.
– No caso concreto do Judaísmo, a edilidade tem um respeito profundo pelo mesmo, desde logo pela sua profunda relação histórica com Tomar, que faz deste concelho um daqueles em que a herança judaica é mais relevante em Portugal. Exemplo disso são as relações de proximidade que a cidade tem tido com Israel, bem como o investimento que tem sido feito na Sinagoga, cujo núcleo interpretativo, devemos sublinhar, mostra de forma clara a perseguição aqui sofrida pelos judeus no século XV, o que não deixa margem para dúvidas da posição do Município em relação ao assunto.
– Assim, vem o Município de Tomar reiterar que nunca teve, nem toleraria que alguém tivesse em seu nome, posições anti-semitas ou de discriminação de qualquer outra religião, povo ou etnia, e que, em relação à utilização por terceiros dos monumentos e espaços museológicos sob a sua tutela, seja para fins religiosos, cívicos ou culturais, devem os mesmos ser sempre solicitados com antecedência aos serviços de Turismo da autarquia.
Resposta de Pedro Turner, presidente da Comunidade Judaica de Tomar
Apraz-nos ver o esclarecimento do Município de Tomar sobre uma situação ocorrida em frente á Sinagoga de Tomar, no sábado passado, dia 19 de Outubro.
No entanto, não poderei deixar de escrever duas ou tres notas sobre o mesmo:
1 – Escreve o Município de Tomar:”- Não sendo na atualidade um espaço de culto, nunca foi negado a ninguém a possibilidade de ali rezar, dentro do horário de abertura e sempre com a salvaguarda de que poderia ocorrer a visita de turistas em simultâneo.”
Pois foi exactamente o que aconteceu. Um grupo de judeus, Portugueses ou residentes em Portugal, em que me incluo, dirigiu-se, no dia 19, à Sinagoga de Tomar, no sentido de fazer algumas rezas – como, aliás, o tem feito ao longo destes últimos anos – sempre (e realço:sempre) sem, de nenhuma forma, condicionar, impedir ou estorvar o movimento normal de turistas/visitantes. Até, pelo contrário, nos momentos em que as rezas são feitas, muitas pessoas que passam na Rua Dr. Joaquim Jacinto, antiga Rua Nova e antes ainda Rua da Judiaria,param, espreitam e entram, demonstrando curiosidade, interesse e até, nalguns casos, emoção, por verem judeus rezando numa Sinagoga ancestral. A funcionária presente colocou-se na porta de entrada, afirmando que eram proibidas “cerimónias” na Sinagoga, impedindo assim, seja por palavras, seja por linguagem corporal, a entrada dos judeus.
2 – Escreve o Município de Tomar: “- Porém, sempre que solicitado previamente ao Município, a Sinagoga tem sido utilizada para cerimónias religiosas fora desses dias e horários, garantindo os serviços da autarquia ou, a pedido destes, a empresa contratualizada, a presença de funcionários para o efeito.”
Ao longo do tempo não tem sido exactamente assim.
3 – Escreve o Município de Tomar:”- No caso concreto do Judaísmo, a edilidade tem um respeito profundo pelo mesmo, desde logo pela sua profunda relação histórica com Tomar, que faz deste concelho um daqueles em que a herança judaica é mais relevante em Portugal. Exemplo disso são as relações de proximidade que a cidade tem tido com Israel, bem como o investimento que tem sido feito na Sinagoga, cujo núcleo interpretativo, devemos sublinhar, mostra de forma clara a perseguição aqui sofrida pelos judeus no século XV, o que não deixa margem para dúvidas da posição do Município em relação ao assunto.”
Espera a Comunidade Judaica de Tomar/AJuP-Associação Judaica Portuguesa que o Município não se interesse – apenas – pela história dos judeus, em Tomar, mas, igualmente, se interesse pelos judeus actuais, que demonstram vontade em que essa mesma história não se perca, não se esqueça e não seja relegada para as salas de arquivo ou os armazéns da Edilidade, coberta de pó (físico, emocional e espiritual) servindo,sómente, para simples “atracção turística”
4 – Escreve o Município de Tomar: “- Assim, vem o Município de Tomar reiterar que nunca teve, nem toleraria que alguém tivesse em seu nome, posições anti-semitas ou de discriminação de qualquer outra religião, povo ou etnia,(…)”
Tenho esperança (quero ter) que será assim, hoje e no futuro, já que, no passado, surgiram situações que podem ser conotadas com atitudes anti-semitas.
5 – Escreve o Município de Tomar:”- O edifício da Sinagoga de Tomar foi adquirido por Samuel Schwarz em 1923 e doado ao Estado Português, em 1939, com a condição de nele ser instalado um museu luso-hebraico, o que aconteceria após obras de adaptação em 1942 e 1943. Mais recentemente, o espaço foi alvo de uma profunda recuperação, que incluiu a criação de um núcleo interpretativo, aberto em 2019.”
Tenho reparado como (convenientemente?)se escreve (não só o Município de Tomar) que Samual Schwarz doou a Sinagoga de Tomar ao Estado Português, com a condição de ali se instalar um museu. No entanto, é sempre esquecido, que, em 1939, não existia nenhuma comunidade judaica, organizada, em Tomar e os judeus que, eventualmente aqui vivessem, ou que por aqui passassem, nesse terrível período, teriam preocupações muito mais importantes, como salvar a vida. Seguramente que Samuel Schwarz, judeu, que já tinha desenvolvido um fabuloso trabalho em relação aos judeus de Belmonte, ficaria muito feliz por a Sinagoga de Tomar, ainda que assumindo o papel de museu, não deixasse de ser o ponto de encontro de todos os judeus, Tomarenses ou não, que nela pretendessem rezar.
6 – Já na semana passada, solicitou a Comunidade Judaica de Tomar, ao Exmo. Sr. Presidente da Cãmara Municipal de Tomar, uma audiência, com carácter de urgência, para debater este e outros assuntos. Continuamos a aguardar resposta.
Pedro Turner
Presidente da Comunidade Judaica de Tomar
A senhora camara mais o seu presidente são magnânimos, sabem tudo, fintam como mestres.
Têm sempre razão, mesmo quando não a têm.
A culpa é da funcionária que lá estava, e que sabia o que podia proibir.
Intoleravel comportamento da autarquia.