Opinião

Já nem a língua pátria respeitam?

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Fernando Pessoa, que nasceu e foi educado na África do Sul, então colónia britânica, usava o inglês como língua normal de comunicação. Talvez por isso, quando se fixou em Portugal, sentiu necessidade de escrever algures “a minha pátria é a língua portuguesa”

Sendo certo que é o povo quem faz a língua pátria, todo o cuidado é pouco, para não a abastardar. Mormente quando se ocupam funções importantes, como representante e em nome dos contribuintes.

Num texto noticioso, inserido na página 6 da edição de 08/11/2020, do semanário Cidade de Tomar, uma conhecida jornalista local refere-se ao monumento central da Várzea grande e ao outro da Estrada do padrão, como PELOURINHO. Da leitura atenta da referida notícia, resulta que quem primeiro utilizou o vocábulo PELOURINHO parece ter sido a srª presidente da câmara. A jornalista ter-se-á portanto limitado a repetir a asneira presidencial, porque nunca convém contradizer quem manda e paga. Sobretudo quando se é jornalista numa empresa privada.

Chamar pelourinho ao obelisco da Várzea grande, ou ao da principal entrada da cidade, é um lamentável lapso vocabular. Em português corrente certificado, PELOURINHO é realmente uma pequena coluna de pedra, simultaneamente símbolo da liberdade municipal para administrar a justiça, e local de exposição dos criminosos condenados, que geralmente ali ficavam agrilhoados “a pão e água”.

Sucede que nenhum dos mencionados na notícia pelas senhoras referidas teve alguma vez essa função. O da Várzea grande comemora um julgamento ocorrido durante o domínio espanhol. O outro celebra o arranjo da estrada naquela zona, durante o curto reinado de D. Sebastião, conforme inscrição na respectiva base.

O único pelourinho existente em Tomar é o do largo do mesmo nome. Substituiu a partir do século XVIII o anterior pelourinho, que se perdeu, e logicamente devia estar frente aos Paços do concelho, em vez do Gualdim Pais, uma vez que representa a autonomia municipal.

Há também o pelourinho de Paialvo, grata recordação dos tempos em que aquela povoação teve autonomia municipal, período que terminou em 1868.

Resta a questão básica: -Se não são pelourinhos, são afinal o quê? -São padrões, como se infere da própria designação antiga da EN 110, a “Estrada do Padrão”. Ou obeliscos não monolíticos.

Dirão talvez os mais obtusos, e de certeza os defensores do rebanho, que é um erro sem importância nenhuma. Uma ninharia. Poderá ser. Mas sendo em português que nos entendemos, ou devíamos entender, se começamos a trocar o nome às coisas, vai ser cada vez mais difícil conversar.

Convenhamos que seria deveras irritante, por exemplo, entrar num estabelecimento para comprar um pífaro e o dono do estabelecimento esclarecer que só tem dos das Caldas…

                                             António Rebelo

 

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