
Sempre que chove muito, o rio Nabão e os tomarenses sofrem com a espuma branca e água escura que se veem no coração da cidade de Tomar.
O principal foco da poluição do rio está identificado há vários anos: a ETAR de Seiça, em Ourém, à qual falta capacidade para tratar os elevados caudais que chegam a esta infraestrutura sempre que chove muito. Esperava-se que a modernização da ETAR levada a cabo em 2024 diminuísse esta poluição, mas tal não aconteceu, uma vez que em janeiro houve novo foco de poluição no rio Nabão.
Durante a inauguração desta renovação, o Presidente do Conselho de Administração da Tejo Ambiente alertou que, para resolver todos os problemas, seria necessário intervir na modernização das condutas que encaminham o afluente para a ETAR de Seiça, que não são separativas e levam a que, sempre que há pluviosidade elevada, a quantidade de água que chega à ETAR ultrapasse a sua capacidade de tratamento. O investimento necessário é de cerca de 19 milhões de euros.
Até aos anos 1950, aceitava-se que a solução para a poluição era a diluição, ou seja, quanto mais água era adicionada, mais reduzida se tornava a concentração de contaminantes. Atualmente, sabe-se que a diluição não pode ser aplicada em larga escala devido ao aumento da população, à maior produção de contaminantes e de resíduos, à não degradação de certos poluentes e à sua capacidade de acumulação, sendo por isso necessário tratar as águas residuais em estações de tratamento, onde a concentração de poluentes é reduzida para poder ser descarregada no meio natural sem o prejudicar e cumprindo com os valores-limite definidos na legislação.
Não se conhecendo o estudo que aponta como solução a substituição da rede, questiona-se se foram equacionadas e analisadas outras opções, como a redução da quantidade de água pluvial que aflui à rede de saneamento e/ ou à ETAR através de soluções de controlo na origem e/ ou soluções de base natural a montante, que podem ter vantagens em termos de custos, apresentar menores impactos ambientais e até ser combinadas entre si e com outras soluções ditas mais convencionais.
É que a forma clássica de gestão de águas pluviais em meio urbano, com recurso a pesadas infraestruturas de engenharia (infraestruturas cinzentas), tem-se mostrado insatisfatória ou excessivamente dispendiosa, uma vez que a construção de sistemas de drenagem separativos pode ainda transportar águas pluviais decorrentes da infiltração e da existência de ligações de tubagens de drenagem de telhados, pátios e logradouros à rede pública. Por isso, têm surgido outras propostas que privilegiam a infiltração de águas pluviais no solo e retardam o seu escoamento (através de trincheiras de infiltração, bacias de detenção, poços absorventes, ou bio-retenção), o desvio de caudais ou o seu armazenamento a montante da rede de coletores ou no interior do próprio sistema de drenagem, permitindo a sua gestão e libertação em tempo seco.
Para perceber a viabilidade destas alternativas, é importante conhecer a percentagem de redução das afluências necessária para evitar estes episódios de poluição. Será possível e economicamente viável recorrer à bio-retenção para fazer um pré-tratamento das águas pluviais, de forma que cheguem à ETAR com melhores padrões de qualidade? Será que se pode construir um reservatório para armazenar os caudais pluviais e só os libertar em tempo seco? Será que podem aproveitar-se zonas verdes para instalar bacias de detenção a montante da ETAR? Será que se pode ir substituindo as condutas de forma faseada e implementar outras soluções complementares?
São questões que só podem ser respondidas com dados, com o levantamento das características do terreno e das infraestruturas, sendo certo que, tipicamente, não há uma única solução para os problemas ambientais e a sua minimização resulta da conjugação de diferentes intervenções complementares.
Como o rio Nabão não tem fronteiras administrativas e políticas, é também necessária uma articulação intermunicipal efetiva para a sua boa gestão.
Em suma, a crise ambiental do rio Nabão necessita do estudo e eventual conjugação de várias soluções complementares e de uma visão integrada e de cooperação entre os vários municípios por onde este curso de água passa.
Joana Simões
Licenciada em Engenharia do Ambiente pelo Instituto Superior Técnico
Mestre em bioenergia pela FCT/UNL
Doutoranda em Ciências da Sustentabilidade na Universidade de Lisboa
Bom artigo, finalmente o assunto é abordado com suporte técnico e científico e não com as atoardas do costume.
Deixo algumas notas para reflexão:
– O problema não é (só) Ourém e a ribeira da Sabacheira/”Etar de Seiça” como os políticos atualmente querem fazer crer. A bacia hidrográfica do rio Nabão é muito vasta e com o especial problema de a metade superior (o Alto Nabão) ser em meio cársico (com rios subterrâneos, etc). O Alto Nabão está em grande parte em rede Natura 2000;
– Na margem esquerda, a ribeira da Póvoa/Ceras drena já uma parte do concelho de Ferreira, onde existe muita atividade agroindustrial (aviários, suiniculturas), esta ribeira também atravessa zonas calcárias, com sumidouros. A ribeira de Chãos tem uma Etar instalada que ao que parece nunca entrou em serviço e também atividade agroindustrial (lagares/aviários), toda ela encontra-se em meio cársico e só no pico do inverno tem caudal;
– Na margem direita e no Alto Nabão, temos a ribeira da Sabacheira (que tem Etar de Seiça, a 3km da foz e parte final em zona cársica – no verão, o efluente é largado em LEITO SECO com sumidouros). No concelho de Tomar a ribeira já não é limpa há muitos anos, e por isso é difícil a população aperceber-se da poluição, com exceção na baixa de Ourém onde são frequentes alertas nas redes sociais (descargas ilegais).
A falta de limpeza estende-se aos antigos açudes agora praticamente destruídos e abandonados e que essas massas de água serviriam eventualmente para a diluição referida, mas também como pontos de água para os animais, reserva de incêndio, regadio, e manutenção de espécies piscícolas (a ribeira seca em boa parte do curso final); o entendimento político atual nesta ribeira é de que são encargos dos proprietários dos terrenos confinantes.. os que cada vez menos ali habitam, claro (na ribeira de Ceras, Beselga, rio Nabão, etc já existe outro entendimento, a ribeira vinda de Ourém deve ser radioativa);
– o emissário da Etar de Seiça está em ruptura na zona de Ourém, aguarda(va?) obras no mês passado: https://www.publico.pt/2025/04/24/azul/noticia/descarga-esgotos-ribeira-seica-ourem-ameaca-especie-risco-extincao-alerta-quercus-2130877
No concelho de Ourém, tem sido feita limpeza do leito da ribeira (por vezes até excessiva) mas do lado de Tomar/Sabacheira não (e existem várias povoações e casas ao longo da ribeira https://www.facebook.com/daniel.rodrigues.332/posts/pfbid0ocDAXpund5cpbUHAtaio1oqPKb47GqTHVBpkugPe2E7sWMRXjWzCDu6uUmY1RtsQl
– esse emissário sempre que chega poluição a Tomar parece ser o culpado de tudo , sendo frequentes as atoardas “não existem redes separativas pluviais /domésticos em Ourém ” -mas querem que no inverno todo o esgoto pluvial e doméstico recolhido em 1/5 do concelho de Ourém passe num tubo de 50cm??
– esse emissário de Seiça também é frequentemente o culpado de a Etar ter ficado no concelho de Tomar, quando chega á questão da luta política de quem fez o quê – mas querem ainda ao dia de hoje que a Etar ficasse em Ourém e a Sabacheira recebesse os efluentes numa ribeira que no verão seca em boa parte do percurso??
– por fim ainda sobre o Emissário e a Etar de Seiça é frequentemente referido que outras governações permitiram que a Sabacheira fosse esquecida, etc (ainda no tempo do SMAS) quando há 20 anos que a Sabacheira já tem rede de esgotos gravítica em grande parte dos lugares (Chão de Maçãs, Comenda, Serra de Cima, Suimo, Pinhal..) e essa rede estar ligada ao emissário/Etar gravíticamente (existe outra parte que necessita de conduta elevatória (Serras, Vale dos Ovos) e que também já foi feita há 20 anos!!;
Assim os habitantes da Sabacheira continuam a ter que construir fossas e mantê-las dos seus bolsos (boa parte em zona cársica e numa zona onde existe a única captação que pode servir Tomar sem recorrer ao Castelo de Bode)
São “só” 800 eleitores que não contam para nada, excepto quando o esgoto chega a Tomar e aí todos apontam para a Sabacheira;
– Um pouco mais a montante da ribeira da Sabacheira, no rio Nabão temos a Etar do Alto Nabão que larga efluente tratado numa zona do rio que no verão tem caudal muito reduzido (que recebe da ribeira do Olival, já que o próprio rio Nabão e todas as outras ribeiras tributárias SECAM totalmente;
– Mais a montante (norte) temos as ribeiras do Olival/Caxarias que no verão são as únicas que ainda escoam fio de água para rio Nabão. Essa subbacia está agora a receber investimento de 1,3M em novo coletor (que inclui ligação a Etar da Zona Industrial que descarrega atualmente no leito da ribeira);
– A sul de tudo o acima referido temos a praia fluvial do Agroal que tem bandeira azul, etc mas só a piscina da nascente!! O leito do rio Nabão (praia fluvial) não é controlado com análises nem tem licença APA para praia.. basta ler as letras pequeninas que estão lá no placard;
Nota sobre a água – Mais a sul/jusante no rio Nabão temos a captação da Mendacha (em zona cársica, com potentes nascentes permanentes para o rio, como o Agroal) que está a ser utilizada – não se sabe quanto contribui para o abastecimento da zona norte do Concelho (subsistema Mendacha), até 2020 era 100%, depois foi feita adutora para entregar água em alta da rede EPAL (Castelo de Bode) passou a ser 0% porque a da Mendacha era má calcária, etc, mas entretanto o valor da EPAL era alto e voltaram a usar a Mendacha (informação dada publicamente pela governação local)..A informação da Tejo ambiente sobre este tema é totalmente opaca , coloca apenas resultados de análises, mas não publica a informação das redes. O tema do abastecimento de água é ainda mais preocupante;
Resumo
– não existe informação sobre o que existe e como está a funcionar (como no caso da Etar da Sabacheira que passaram-se anos a dizer que não havia problema nenhum e depois afinal foi preciso investir 2M€ em reparações (por ter estado sem manutenção.. já que a capacidade e tecnologia de tratamento da Etar manteve-se igual);
– não há informação sobre o que falta fazer das redes de esgotos e seu tratamento (e na água de consumo é o mesmo ou pior)
– será isto território de caciques?
Olá,
O rio Nabão merece um estudo integrado envolvendo todos os municípios por onde passa para identificar as fontes de poluição e poder propor soluções e estimar custos.
Na última reunião da Câmara, o Senhor Presidente também falou nos aquíferos e que a sua contaminação também poderia estar a contribuir para a poluição no Nabão. Que dados e informação tem para fazer esta afirmação?
O que tenho lido na comunicação social é que o principal problema é a ETAR de Seiça e que a solução requer 19 milhões de euros.
Obrigada