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A história dos Tomarenses na pesca do Bacalhau

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A ligação de Tomar com a pesca do bacalhau não é óbvia à primeira vista, considerando a sua localização interior e distante da costa.

No entanto, diversos fatores motivaram os habitantes de Tomar, e de outras regiões do interior, a juntarem-se às campanhas bacalhoeiras, após os tempos áureos da Frota Branca do Bacalhau, conhecida pelos seus lugres, sendo que estes tomarenses estiveram já embarcados em navios-motor e arrastões.

Estes navios-motor e arrastões foram a resposta às inovações tecnológicas e às demandas crescentes por eficiência e maior capacidade de captura. Esta mudança foi também impulsionada pela necessidade de competir com frotas de outros países, que já estavam a modernizar as suas operações pesqueiras.

Os navios-motor, ainda que fossem de artes de anzol – pesca à linha com dóris – mais rápidos e capazes de navegar independentemente das condições do vento, permitiram viagens mais longas e mais seguras. Com motores mais potentes e equipamentos modernos, estes navios podiam transportar maiores quantidades de peixe, aumentando a lucratividade das expedições.

Os arrastões representaram uma mudança ainda maior. Diferentemente da pesca tradicional, que utilizava linhas, os arrastões usavam grandes redes para capturar o bacalhau. Esta técnica permitia a captura de volumes muito maiores de peixe, mas também era mais controversa devido ao seu impacto ambiental e às mudanças que impôs nas práticas tradicionais de pesca.

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No entanto, esta época, particularmente na década de 1960, foi marcada por uma intensa atividade pesqueira, onde muitos portugueses, incluindo tomarenses, embarcaram em campanhas de pesca do bacalhau.

Primeiramente, a pesca do bacalhau era vista como uma oportunidade económica. Durante os anos 60, Portugal ainda enfrentava dificuldades económicas e a falta de emprego era um problema sério, especialmente nas áreas rurais e do interior. A pesca do bacalhau oferecia não só um salário, mas também uma aventura e a possibilidade de escapar à vida monótona e dura do campo.

Além disso, a pesca do bacalhau era também uma questão de prestígio e orgulho nacional. O Estado Novo, regime ditatorial que governava Portugal na época, promovia a ideia de que participar na pesca do bacalhau era um ato de patriotismo, contribuindo para a autossuficiência do país em termos de alimentação.

Interessante notar que muitos dos que partiram de Tomar e outras áreas para as campanhas de pesca do bacalhau o fizeram por apenas uma temporada. Isto pode ser explicado pelo facto de que a vida a bordo era extremamente dura e perigosa, com condições de trabalho árduas, longas jornadas e riscos constantes. Após experimentarem a realidade da pesca do bacalhau, muitos optaram por não repetir a experiência.

Adicionalmente, na década de 60, houve uma significativa emigração de portugueses para outros países, em busca de melhores condições de vida.

Muitos tomarenses, talvez alguns dos que haviam participado nas campanhas bacalhoeiras, acabaram por emigrar, especialmente para países como França e Alemanha. Isso contribuiu para uma diminuição no número de pessoas disponíveis e dispostas a embarcar nas campanhas subsequentes.

Em resumo, a relação de Tomar com a pesca do bacalhau, especialmente durante a época da Frota Branca, é um reflexo da situação socioeconómica de Portugal naquele período. Foi uma combinação de necessidade económica, oportunidade de aventura, orgulho nacional e, eventualmente, um trampolim para a emigração e a busca de uma vida melhor.

A História dos Tomarenses na Pesca do Bacalhau
Declaração prestada ao Grémio de Armadores de Navios de Pesca do Bacalhau, para fins de inscrição

O Museu Marítimo de Ílhavo dá-nos a conhecer sete Tomarenses, dos quais apenas um era residente no concelho, que embarcaram para a pesca do bacalhau, no exercício das suas funções:

  • António Martins José, oriundo da freguesia de Alviobeira, nascido a 13 de fevereiro de 1934, esteve embarcado em 1963 no como 2º maquinista no arrastão David Melgueiro e em 1969, como 1º maquinista no arrastão João Martins;
  • José António das Neves, oriundo da freguesia da Sabacheira, nascido a 4 de junho de 1933, esteve embarcado apenas na campanha de 1962, como eletricista, no navio-motor Rio Lima;
  • Ruy Fernando de Araújo Pereira de Mattos, oriundo de Tomar, nascido a 11 de abril de 1923, esteve embarcado apenas na campanha de 1948, como piloto, no navio-motor Capitão Ferreira;
  • António da Costa, oriundo da freguesia de Santa Maria dos Olivais, nascido a 2 de janeiro de 1909, esteve embarcado nas campanhas de 1967, 1968 e 1969, como telegrafista, no navio-motor Nossa Senhora da Vitória;
  • Manuel Ferreira, oriundo da freguesia de Casais, nascido a 20 de abril de 1929, esteve embarcado apenas na campanha de 1958, como fogueiro, no arrastão Pádua;
  • José Manuel Mateus da Silva, oriundo da freguesia de São João Batista, nascido a 2 de janeiro de 1950, esteve embarcado apenas da campanha de 1968, como ajudante de motorista, no navio-motor Nossa Senhora da Vitória. Curiosamente, nesta jornada, teve a companhia de António da Costa (já referido), seu conterrâneo, que partilhava a mesma data de nascimento, 2 de janeiro, mas do ano de 1909;
  • Sebastião Lopes de Oliveira, oriundo da freguesia da Beselga, nascido a 30 de janeiro de 1938, esteve embarcado apenas na campanha de 1967, como 1º maquinista, no arrastão de popa Santa Isabel. Este arrastão viria a naufragar pouco anos depois, a 23 de abril de 1971, após embater num iceberg do tipo growler, no Banco Russo, Terra Nova.

Estas histórias individuais, embora singulares, refletem um padrão mais amplo de coragem, sacrifício e determinação que caracterizou muitos dos homens de Tomar e de outras partes de Portugal durante essa época.

A sua participação nas campanhas bacalhoeiras, apesar dos perigos e desafios, constitui um testemunho da sua força e resiliência.

Através destes relatos, perpetuados pelo Museu Marítimo de Ílhavo, a memória daqueles que enfrentaram os mares gelados na pesca do bacalhau continua viva, ilustrando uma faceta marcante da história e cultura portuguesas.

Este legado, imortalizado na história de Tomar e nas vidas destes homens, continua a inspirar gerações, recordando-nos da bravura e do espírito indomável do povo português.

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